Caixa Crônica

Hoje a professora pediu para nós fazermos uma crônica, eu já fiz algumas, mas hoje confesso que estou completamente sem inspiração. Hoje minha bendita cabeça não quer se dar o trabalho de pensar em criar uma crônica. Nós estudamos em uma caixa branca. Isso mesmo! Você não entendeu errado!  Uma sala toda branca, escura, abafada, ar condicionado-trovão, com as veias-fiações expostas no teto. Eu tenho uma sensação de loucura nessa sala, me sinto sufocada e agoniada como se estivesse em um hospício ou sei lá aonde, um espaço inominável... menos em uma escola.
 Os alunos saíram para o intervalo, a professora entrou na sala e colocou uma música bem tranquila...no começo pude até me sentir um pouco mais confortável, mas não se engane... essa tranquilidade durou pouco: logo começa um barulho vindo da academia de ginástica, que fica bem em cima da nossa sala. Ah, como é difícil se concentrar com o barulho de pessoas correndo em esteiras e outras derrubando pesos no chão. O teto treme, meu coração também. No começo, como ainda não estava conformada (conformar: capacidade-huma-destrutiva) com esta situação, eu passava muito medo, tinha uma vontade enorme de sair correndo para fora do prédio e poder respirar tranquilamente. Ufa! Mas acho que as pessoas iriam achar que sou louca, porque algumas delas não se importam com o teto quase caindo sobre nossas cabeças, com uma arquitetura castradora que começa a desenhar dentro de mim todas as grades invisíveis da sala, do andar, a parte que não nos cabe neste latifúndio. Ou elas apenas se conformaram como eu?
            Engraçado, a caixa branca fica até bonita quando se toca uma música dentro dela, mas sempre algo interfere nessa beleza, logo o teto treme novamente e um maldito passarinho assovia no celular de alguém. Sério!? Logo agora que eu estava pronta pra começar a escrever minha crônica. Eu odeio esse passarinho que assovia o tempo todo, esse maldito pássaro está em todos os lugares. Por favor, gente, mude o som do seu whatsapp, pelo bem da humanidade e dos nossos ouvidos. Já basta os pesos constantes da academia sobre nossas cabeças. Eureka: o barulho constante é uma espécie de tortura, por isso qualquer mínimo som aciona o monstro dentro da gente.
            Saio da sala, volto e vejo que os alunos estão vendo um filme. Então, eu me sento, pego uma coca-cola da bolsa para beber e quando eu abro a dita cuja ela dá um estouro bem alto, assustando a professora e os outros alunos. Eles devem ter pensado: ― Que diabo de barulho é esse? O estouro foi sinistro, na hora fiquei sem graça, mas depois pensei que seria um bom efeito sonoro para quando tivéssemos uma epifania. Iríamos ouvir esse barulho por aí o tempo todo, seria bem melhor! Engraçado, não acham? Ui! Acho que este espaço afetou minha percepção do que é risível ou não. Ah! Eu sou tão engraçada!! KKKKKKKKKKKKKKKKKK!!!!!
            Depois do susto fui beber a coca e estava tão quente que fiquei desanimada e me arrependi de não ter trazido o bolinho que a minha mãe me deu antes de eu sair de casa... serviria para enganar o estômago, porque não dá pra comer todos os dias aqui em Taguatinga, nós somos apenas estudantes e não temos dinheiro todos os dias para pagar três reais em um salgado.
            Parei para ver o filme, vi uma mulher que se importava demais com as outras pessoas e que se esqueceu dela mesma e vi também um corpo de um travesti ensanguentado, sendo queimado no chão. Foi impactante. Esqueci que eu estava na caixa branca.
          No caminho de casa, vi muito dentro das pessoas e não achei nada engraçado.

Cheguei em casa e depois de um tempo lembrei: ― Meu Deus! Eu ainda tenho que escrever a crônica! Já sei! Eureka: vou abrir minha caixa preta para me inspirar!!

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